23 de jul. de 2013

Fora do ar


Pegou-o de surpresa, no varandão de vidro, enquanto olhava distraído a exuberante paisagem do alto do Pontal do Atalaia - Arraial do Cabo, RJ:
-Tá fazen'o que aí, sujei'?
Era uma manhã daquelas, de sol fraco, um tanto nublado, vento fresco e aquele cheiro de mar invadindo tudo.
-Tamos aí, mocinha...
-Pensan'quê, rapaz? -voltou ela, puxando assunto, carregando naquele mineirês cheio de charme.
-Na verdade, agradecendo essa maravilha toda... Estar aqui, diante dessa natureza, com pessoas queridas...-disse isso já enlaçando-a carinhosamente na altura do pescoço. Foi retribuído com o aconchego dela.
-...Hum... Q'bom! Tendi...
E ficaram ali, em silêncio precioso, por alguns minutos mais, apenas se deleitando com a visão que só quem conhece aquela pousada -no topo do morro- pode compreender. 
Mais um pouco e ela, mulher curiosa que só, insistia:
-Escut', você assim... não se sente só não?
-Tem certeza que é essa mesma a pergunta que você quer fazer? -disse rindo, voltando-lhe o olhar.
-É sim... É que vejo 'cê sempre tão dedicado à nossa amizade. 'Cê não tem assim... um amor, uma paixão? Alguém que te faça abrir mão um pouquinho que sêj'dos amigos, que te tire da rotina num ato de loucura?
-Sei... Entendi qualé a sua, mocinha. Mas tenho sim, se você quer tanto saber... Ela me faz isso. Me liga e eu abraço a causa. Velório de cunhado, aniversário de cachorro, festa sem cerveja, hospital de madrugada...
-Nó... Tem u'a sortuda ocupando esse coraçãozinho!... -retrucou ela, meio debochada, meio admirada.
-Sortuda eu não sei se a pobrezinha é, mas que a vaga estaria garantida se ela quisesse, com certeza...
-Peraí, "se quisesse"? Ela ainda não tomou posse da vaga? É ceg'a moça?
-Ah, isso deve ser mesmo... Com certeza! -disse irônico.
-Que absur'! E com'é que'la é? Conta! Conta! Danadinho 'cê, escondendo o jogo né...
-Ah, é gente fina, é inteligente, é carinhosa, é amiga, é linda... Pô, é tudo o que um homem pode querer. Só que eu tô na zona de amizade dela, sacou? Aí complica... Caso sério.
-Compli'quê, bobão? Tá na cara qu'ela ia querer cultivar mui' mais coisa além dessa grande amizade de 'cês. Eu conhec'ela?
-Acho que sim... Se bem que às vezes nem a gente se conhece, né... Mas acredito que você a deva conhecer sim...
-El'é daqui do Rio? -apertou o cerco.
-Não. Da sua terra.
-Uai! Mineira, sô?! -apertou ainda mais o sotaque- Que'u conheço também?! N'é possível! Me diz quem é que'u vou ligar pr'ela agora e fazê-la abrir os olhos na sua direção, meu bem... El'está em Minas?
-Não. Está aqui, no Rio. Mas não precisa... Deixa como está. É capaz de, se ela descobrir, mudar, se afastar, sei lá. Não quero isso não. Já chega, sabe. Chega de abrir o jogo e não dar em nada. Pior: ela ficar me fazendo passar vontade sabendo da situação, sem intenção e em nome da amizade... Isso é foda! Não quero mais isso não. Se tiver que sofrer, que seja em silêncio. É mais digno.
-Ah, que isso... Fala sério... Não acredito nisso que tou'vindo... Quant'orgulho besta... E justo de 'cê que tanto me diz pra não agir assim?
-Ué, sou mal resolvido também, minha querida... Ou pensou que eu era um poço de superação? Sou nada.
-Francamente... To'a vergonha... Ei! Esqueci meu celular lá no quarto. Vou pegar, viu metidão...
-Faz um favor pra mim, investigadora de pão de queijo? Passa no meu quarto e pega o meu também, na mochila...
-Tá bom, moço... -e se virou, murmurando, fazendo as contas e achando graça, continuando- Quem será 'sa mulher, meu Deus d'céu?...

Quem seria...

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