16 de nov. de 2009

'Você vai me seguir', do Chico Buarque

Gosto muito de música. Não um estilo específico, um rótulo. Gosto mesmo de música boa.
Costumo dizer que -pra mim- música é um estado de espírito. É a mais pura verdade.
Dependendo do momento, uma música marca aquela fase, aquela situação. Quando mais agitado, quando mais tranquilo, mais carente, mais carinhoso, mais desejoso, mais saudoso...
É claro que tenho preferências: rock, mpb, house... mas isso não é nada.
De acordo com o momento, gosto de ouvir uma mesma música seguidas vezes, por vários períodos, perceber os detalhes da harmonia, da letra, do que o autor quis dizer, o que poderia estar pensando ou querendo passar...
'Você vai me seguir' -do Chico Buarque- é a bola da vez, atualmente.
Como tenho ouvido essa música, me deliciado com ela...
Ela tem um clima 'passional', de proibição/submissão, como um bom romance policial ou um caso de Nelson Rodrigues. Pelo menos, é o que eu sinto ao ouvir os arranjos da música.
Depois, a letra parece contar a história de um homem que encontra sua 'vítima conivente', 'consentida' e nela se realiza em desejos impuros, mas também 'amorosos'(?). Uma mistura louca de amor e ódio. Inexplicável aos alheios.
E com o andar da letra, aquela relação doentia e mútua vai evoluindo, e as posições mudam de lado. Enquanto o dominador segue por um caminho -que se deixar enganar, se deixa 'cegar', a vítima vira algoz, numa assimetria que só a inferioridade permite agir.

Você vai me seguir aonde quer que eu vá
Você vai me servir, você vai se curvar

Você vai resistir, mas vai se acostumar
Você vai me agredir, você vai me adorar
Você vai me sorrir, você vai se enfeitar
E vem me seduzir
Me possuir, me infernizar

Você vai me trair, você vem me beijar
Você vai me cegar e eu vou consentir
Você vai conseguir enfim me apunhalar
Você vai me velar, chorar, vai me cobrir
e me ninar

Após o 'fim' dessa dor toda, parece que ela, apesar de toda sua traição, se sente infeliz com o fim de seu dominador. Muito intrigante, muito agonizante.
O que seria esse 'apunhalar'? Um crime? Uma traição? Fica o mistério...
E quando ele diz que 'vai me velar' e depois 'cobrir e ninar'... Confunde tudo novamente. Esse velar seria relacionado a sepultar o amor? A guardá-lo escondido nas entranhas do coração? Se libertar da insana relação?
A música, em certa parte, conta com as vozes do MP4. Bom demais. Tanto quanto a voz curta de Chico. Vai saber o que se passa na cabeça desse gênio?
No fim, as palavras se misturam e o 'me ninar', vira um 'menina'.
Simplesmente perfeito.
Quem ficou curioso, deveria ouvir.
Quem já ouviu, devia ouvir novamente, sob nova ótica.

5 comentários:

  1. Concordo plenamente, comigo acontece extamente o mesmo, para cada fase da minha vida tem uma trilha sonora, sempre tem uma música para marcar um momento meu...

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  2. Ahh claro, também adoro essa música...

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  3. Está dificil encontrar textos na net a respeito desta música naquela que eu considero a perspectiva correta - exceção feita ao texto da revista fenix (http://www.revistafenix.pro.br/pdf/Artigo%20Christian%20Alves%20Martins.pdf). Na verdade, para mim, Chico nesta música dá toda a pinta de falar sobre a ditadura. Ela pode até amá-lo quando segue as regras da opressão, mas irá sempre caçá-lo, traí-lo e apunhalá-lo. É claro que este paralelo pode ser feito com nossas vidas amorosas que aparentemente seguem uma mesma linha de raciocínio, porém, não sempre. Enquanto no amor eventualmente encontramos alguém que não nos afete negativamente ou desistamos do amor, na ditadura haverá sempre perseguição.
    Abs!

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  4. Luis, meu querido! Gostei muito da sua perspectiva sobre essa canção do nosso Chico!
    Acho que minha interpretação foi absolutamente romântica, e certamente não abri espaços para uma visão com 'outras intenções' igualmente possíveis... (coisa tão comum e necessária à epoca da ditadura...)
    Se o Chico conseguiu dar um nó na Ditadura, como não daria em mim também? rs
    Muito obrigado por compartilhar seus pensamentos!
    Abraço!

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