26 de nov. de 2009

A Maldição

Amanheceu o dia e os olhos continuavam ardidos. Os cantos deles, avermelhados e as pálpebras, inchadas. As lágrimas varriam as faces e marcavam -fartas- o chão. Encontrava-se sentado à beira da cama, semi-nú, acorcundado, de pose desanimada. Assim se percebia a muito mais que uma noite. Faziam dias, semanas, meses... nem se lembrava mais do tempo. Provavelmente o mesmo havia parado.
O olhar virado ao nada e a mente à correr em círculos repetidos e infinitos... a cegueira, a ação e a reação, a cegueira, a ação e a reação, a cegueira, a ação e a reação... incessantes. Era sua maldição. Fadado estava à ela por suas próprias mãos.
A dor. Essa sim, se fazia companheira. Cada vez mais dolorida, sofrida, aguçada.
E sentia morrer por essa dor. Sentia-se esvair da vida. Estava seco. Como se as chagas dos tropeços impensados estivessem a lhe queimar o corpo dormente. Buscára o álcool como alívio, na tentativa de ter as idéias deturpadas, mas o seu efeito de torpor apenas evidenciava ainda mais sua frustração, seu sofrimento.
Buscava até mesmo a insanidade. Isso porquê a loucura da consciência não lhe fora reconhecida como tal. Para se ter uma idéia, o melhor de tudo passou a ser 'ter méritos por tanto sofrer'.
Tamanha a dor, que lhe absorvia a fome, a sede, as idéias. Dela e para ela vivia desde a queda.
O dia seguia e junto dele, o seu pranto contínuo, íntimo, lascivo.
A consciência: navalha afiada na pele das lembranças do erro. Corrente limitadora de rumos, de avanço, de progresso. Clausura e tortura não conhecidas de antes, mas íntimas de agora.
Sofria de arrependimento, de remorço profundo e sincero. E nem eles eram garantia de perdão algum. Nada mais acontecia desde então. Vivia morto.
Mas as lágrimas persistiam como molho àquele prato difícil de engolir. Mas ele repetia mesmo assim.
A noite caiu e o foco se mantinha o mesmo. A queda estava lá, para onde quer que olhasse.
Não havia ânimo para perceber a vida que seguia lá fora. As estrelas haviam se apagado no negro da escuridão. Não percebia nem mesmo o turbilhão que se formava na tempestade. Na chuva que se juntava às suas lágrimas, numa moldura triste para o seu momento.
Madrugada adentro e toda dor se evidenciava ainda mais. Não descansava os olhos que mais pareciam vazados à jorrar a salubridade daquela tristeza. E o pensamento não fugia dali. Nem mesmo à lhe recordar os tempos de alegria e de sonhos. Até estes, eram momentos de angústia agora.
O coração sofria novo baque... mais uma vez, amanheceu.

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